Vi de longe um coração sangrando
Vi de longe um coração
sangrando,
arrancado à órbita natural
de expressão,
novo planeta evidente
exposto à curiosidade popular
& à presença dos cães
vadios e famintos,
rimbombando vermelho
protesto,
urgindo vida na via pública.
Apesar da distância,
pude ver o povo
escandalizar-se
— alguma coisa borrifada nas
golas dos homens
como irremediável beijo —
urucum na cara do povo,
escrevendo histórias,
posteridades.
Apressei o passo inutilmente,
a tempo de ver a noite chegar
(chamada talvez por um
morador aflito
das vizinhanças)
& as sombras olharam-me
por sobre os ombros
& negaram tudo.
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Ilustração de Rabel Daniel, dp