Bom-dia, mulher.
Resgato-te da noite
de nobres falidos,
jovens cegos de paixão
& facas traiçoeiras
dos portos de Hong-Kong.
Faço-te testemunha
da doce violência
de tua própria vida,
parindo mutantes
em meio a tardes mornas de seda
vinho & amargura.
Nada do que conheces
me ficará oculto um dia.
Limpo minhas armas,
satisfeito na familiaridade
da tua nudez,
adentro os templos
transformado em mulher
& vejo-te homem
pouco antes de transmutarmo-nos
em criatura sem nome, forma
ou história.
Soa, precisa e fatal,
a hora de encontrar-te,
agonizante e ressurrecta,
abandonando roupas putrefatas
nas estradas.
Vestes, é certo,
o uniforme da mais-valia
dada pela opressão que inventa
uma irônica liberdade
da qual padecemos.
Mas, clandestina,
dão-te nas sombras
a palavra de passe da insurreição,
a vocação de mulher armada
& combatente no Deserto,
tomando de assalto, um dia,
as fábricas & o Reino.
Vagas nos bosques,
em busca de uma cabana,
mantas de pele de urso
& véus negros & sabres perdidos
nas dobras do tempo
& de tua consciência.
Mas tua presença é bailarina,
recebendo-me sôfrega
nos salões de delícia do Inferno,
adormecendo cansada de um dia de opressão,
nuvem translúcida
curando leprosos nos hospitais da Índia.
Anseio ver-te cega na Estrada de Damasco.
É tua a poesia?
ResponderExcluirMuito legal!
Postei uma poesia da Viviane Mosé muito legal lá no meu blog. Embaixo eu coloquei o áudio, depois dá uma olhada lá.
Abraços
Sim, Guilherme, o poema é meu. Foi escrito já há muitos anos, para uma guerreira que amei muito, mas que desapareceu na poeira do tempo...
ResponderExcluirVi de relance o poema de Viviane Mosé e ainda não vi o vídeo. Vou voltar lá com mais calma, pra ver a ambos.
Abraço fraterno,
Mac
Marco!
ResponderExcluirAssisti um filme uma vez em que o pai, para incentivar o diálogo em família, pedia que cada um trouxesse algo que aprendeu durante o dia para contar na hora do jantar.
Então, no jantar de hoje já tenho minha pérola pra dividir: Saulo de Tarso e a estrada de Damasco.
Bjs
Luciene
Lembro-me de que, na época em que escrevi o poema, algumas pessoas estranhavam o verso final. Achavam-no agressivo e cruel. Não associavam ao episódio de Saulo, na Estrada de Damasco. É o melhor que eu poderia desejar à minha amada...
ResponderExcluirBeijosssss,
Marco
Oi Mac
ResponderExcluircomo assim o melhor que você poderia desejar a ela? gostaria de ve-la frágil e necessitando de você?
não entendi.
bjs mil
Oi, Clê,
ResponderExcluirEm que ponto você a vê frágil e necessitando de mim?
Beijosss,
Marco
Infelizmente desta vez não poderei opinar.. Esse poema é complexo demais para mim, haha.. Preciso viver um pouco mais para compreendê-lo. Mas, é uma bela imagem, esta que inicia o poema, de Audrey Hepburn como guerrilheira.
ResponderExcluirBeijoss
Ísis
Essa imagem é mesmo a melhor que pude obter para ilustrar "Bom-dia, mulher". Casa bem a beleza e a feminilidade de Hepburn, com a força e a coragem da guerrilheira. E é aí que o poema se torna menos complexo do que poderia parecer à primeira vista. Você não precisa entendê-lo, Isis. Basta vivê-lo, senti-lo.
ResponderExcluirBeijosssss,
Marco
Marco
ResponderExcluirMe corrija por favor.
O que entendi foi que a mulher amada era uma guerreira equivocada, que travava uma luta inútil em sua vida baseada em princípios ilusórios.
E no meio dessa batalha da vida dela aparece o homem que, enxergando tudo isso, deseja que ela finalmente desperte diante de toda ilusão de sua vida de guerreira e enxergue finalmente a verdadeira luz.
Viajei? rs
Bjs
Luciene
Oi, Luciene,
ResponderExcluirExatamente. O poeta aqui NÃO é o causador da revolução interior da amada. Ele participa de seu despertar, quando a resgata de “nobres falidos, jovens cegos de paixão e facas traiçoeiras dos portos de hong-kong”. E acompanha o processo de despertar dela, e, de certa forma, participa disto. Alguém, ou alguma coisa (não é ele, o sujeito é indefinido), transmite a ela a “palavra de passe da insurreição, a vocação de mulher armada e combatente no deserto”. Ele apenas está com ela, luta com ela e torce por ela. Ama-a intensamente e anseia para que ela fique “cega na Estrada de Damasco”. Acho que você pegou bem o ethos do poeta.
Beijossss,
Marco
Sei lá, você a descreve como uma mulher tão forte, tão livre (me corrija se eu estiver errada) e depois ansiando por vê-la cega na estrada de Damasco, se associarmos a Paulo de Tarso, acredito que assim que ele ficou depois do tal encontro, frágil, necessitando de ajuda, entendi que ao menos uma vez, você gostaria de ter ela ao seu lado simplesmente humana, após um encontro, talvez consigo mesma, necessitando de cuidados...
ResponderExcluirNão foi isso???
Oi, Cleo,
ResponderExcluirPode ser, sim, que você esteja certa. Eu não me sinto muito “dono” do poema, apesar de tê-lo escrito. De forma que penso que poemas tornam-se aquilo que as pessoas sentem a respeito deles. Acabam, então, tendo várias leituras, à medida em que a personna do poeta (não o poeta ele mesmo, necessariamente) acaba sendo o que os leitores sentem.
Mas na minha própria leitura, há diferentes momentos da mulher do poema. O primeiro, nas duas primeiras estrofes. O passado dela, do qual o poeta a resgatou. O segundo, na quinta estrofe, em que eles se encontraram e se amam. O terceiro, nas sexta, sétima, oitava e nona estrofes, onde o poeta a vê transformar-se, transmutar-se, enquanto ambos continuam a se amar. E o quarto, na décima estrofe, em que o poeta anseia pela iluminação da amada.
Então, ela está se fragilizando porque está vivendo uma morte, uma morte espiritual, da qual renascerá luminosa, e não porque esteja fraca realmente. Sob um certo ponto de vista, é ela, na verdade, quem o fortalece.
Beijosssss,
Marco
Então pode ser que eu a vi fragilizada porque na verdade eu é que estou????
ResponderExcluirbjs
(gostei disso)
Bem, fragilizada ela está, Cleo. Mas essa fragilidade é parte de um processo, de uma "morte" necessária a um renascimento. É crescimento. Você a vê fragilizada porque ela está realmente fragilizada. Mas você pode estar associando a fragilidade dela à sua própria, sim. Claro. Resta saber se a sua é fragilidade pura e simples, ou também, como a dela, parte de um processo de transmutação. Mas aí, como disse-me uma vez um cavaleiro, "são o segredo e o mistério de cada um".
ResponderExcluirBeijosssss,
Marco
Marco, saudade dos seus posts...
ResponderExcluirBjs
Luciene
Aqui ou lá? Bem, tô meio no corre-corre, mas volto logo logo. Tanto praqui, quanto pra abrir as asas, finalmente, no Lado Bruxo.
ResponderExcluirBeijosssss,
Marco